Noite imprudente

Eu sempre quis que você me jogasse na sua cama
e me abrisse inteira, lasciva, conversasse comigo
a minha história toda, todos os pormenores,
todos os desejos que as minhas pernas abertas pedissem,
o que os meus seios tremessem e o que minha boca entumescesse,
e todas as vertigens que as suas mãos nos meus cabelos
provocassem, machucassem, me colocassem a par
do que é ser mulher inteira, fêmea, gêmea de Afrodite,
cavalgando terras desconhecidas. Eu chuparia o doce
do seu corpo, do seu dorso, da sua falange,
os seus pés seriam meus brinquedos íntimos,
entrariam como carros estacionados no meio de mim
e os sentiria como se sente a um pau, dormente, quente,
grosso e gentil, um pau que entra sem pedir,
mas que entra como um pau deve entrar, rasgando a alma,
como dedo em riste, como a perna flexionada,
como a força da mão ao puxar uma gaveta.
E dentro de mim você fosse o alazão da casa de meus pais,
com o pelo bonito, os músculos tesos, e o hálito quente
que me acariciasse as costas, os ouvidos, os seios
e minha púbis, contorcida com tanta saliva,
eu me abriria mais e mais e mais e mais ainda
para as suas mãos macias e o seu olhar intravenoso,
a sua boca cheia de dentes, que me comeria,
como um canibal a mirar a sua presa.
E me faria sentar no seu rosto, mergulhando minha fome
na sua vontade de comer, seríamos dois apaixonados
sem saber fazer paixão, dois amantes que desconhecem o amor,
um casal que desconhece a cumplicidade, pois seríamos
dois anjos à procura de entender o porquê das asas,
dos voos, das cambalhotas, dos olhos virados,
da ânsia. Ah, como eu sentiria ânsia do seu gosto,
do seu pau duro, da sua lascívia pasteurizada
e das nossas vontades esfregadas em ambos os corpos.
Eu desceria ao inferno atrás do seu sexo impúdico,
da sua bunda, do seu carinho e do seu tratamento
tão viril, montado à sua égua, o seu brinquedo,
o seu animal de estimação. Renderia-me à boca cheia
de palavras incautas, malditas, vindas de calabouços temidos,
insípidos, inebriantes, tais como a mente dos jovens
de mãos leves e paus rosas, e corpos atléticos,
que descem ao inferno para satisfazer sua imaginação.
Mas você seria a minha redenção, a minha prisão,
uma liberdade ilusória, um dizer que sim travestido de não,
um machista barato, um todo regalo, você seria o melhor de nós,
mas eu não poderia e não quis porque deus é comigo
e nada nada nada me faltará diante da tentação
que é o seu pau, o seu ser, o seu querer, o ser você.




[O poema nasceu enquanto eu assistia a "Howl"]

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